Já no ultimo terço de “Faroeste Caboclo”, quando nada mais é novidade,
nem segredo, para personagem nenhum e nem para o espectador, o protagonista,
bandido, traficante e assassino está com a cara toda arrebentada, olho roxo, hematomas
de todos os lados, fodido total, hemorragia no olho e perseguido pelo grupo
traficante dos boyzinhos... Então, ele se senta na porta da sua favela com uma
espingarda nas mãos... A mocinha senta-se ao seu lado e pergunta: “O que está
acontecendo?”. A salvação da cena seria se ele respondesse: “Nada. Estou aqui, só
esperando que chova e faça sol ao mesmo tempo, pra ver um arco-íris!” Mas ele
não disse! Naquele momento eu, de verdade, não consegui evitar uma gargalhada,
porque era, sim, muito engraçado. Um dos preconceitos com o cinema brasileiro é
o de que não temos bons roteiristas, mas não sei... Acho que nosso problema,
hoje, não é a bilheteria, isso é certo... Nosso problema é com o cinema mesmo! Nossos
diretores ou vêm da publicidade ou da televisão, gente com um olhar muito
objetivo com relação ao “produto” e, pelo que se vê nas telas, com pouquíssima
preocupação com a linguagem cinematográfica, seus mistérios, possibilidades e
as mil e uma formas de estabelecer contato com o público. Acham que tudo se
resolve na edição e na pós-produção. Do ponto de vista da banalidade popular e
facilmente compreensível pelo público da televisão, até acho que sim. Mas
quando o assunto é cinema, cinema de verdade...! Por outro lado existem alguns
conceitos que eu acho que são muito discutíveis. Um deles é o de que o cinema é
imagem. Como se as pessoas não falassem! Eu vejo filmes de todas as
nacionalidades e que foram feitos desde que o cinema descobriu o som e os personagens
falam e muito! Reduzir o diálogo a grunhidos, expressões banais e meias
palavras como acontece, por exemplo, com “Faroeste Caboclo” é abrir mão da
palavra como linguagem artística, coisa que o cinema usa e abusa desde que
existe! Outra coisa que se percebe (outro preconceito?) é o de que quanto maior
o número de pessoas que assinam o roteiro, pior ele é. Em “Faroeste Caboclo”
tem até duas pessoas que auxiliaram na construção dos diálogos. Que diálogos?
Até a novela das nove tem diálogos mais elaborados! O fato é que quanto mais gente
se mete num processo, mais sem personalidade ele fica, mais aguado, mais banal,
mais sem alma... E até pode servir ao bilheteiro, mas ao cinema mesmo! Outro
problema é quando o assunto é interpretação. Nossos cineastas acham que
interpretar para o cinema é falar tudo com absoluta naturalidade e aí o que se
vê é um cinema com cara de TV. Meu Deus, é só assistir a filmes do mundo
inteiro, desde 1930 até 2012 e perceber que os atores interpretam sim; e na
maioria das vezes sem a menor naturalidade, mas com imensa verdade! O que tem
de natural Fernanda Montenegro em “Central do Brasil”? Nada. O que ela faz é
uma coisa profundamente artística! Assim como Daniel Day Lewis em “Lincoln”! Ou
o Moacir Franco em “O Palhaço”? Eu penso que, pela lógica de nossos cineastas,
alguns filmes nunca teriam sido feitos. E só pra citar os mais modernos... “Lincoln”,
“Life Of Pi”, “Hable Con Ella”, “Quatro Meses, Três Semanas e Dois Dias”, “Uncle
Boonmee...”, “Amores Perros”, “Dogville”, “A Caça”, “Django, do Tarantino”,
etc, etc, etc...
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